Com bloqueio de recursos pelo governo, nenhum hectare de verão teve proteção contratada]
O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) tinha orçamento previsto de R$ 1,06 bilhão, mas, em junho, o governo bloqueou R$ 354,6 milhões desse montante, uma decisão que ameaça a proteção da safra 2025/26 de soja. O plantio do grão está em andamento, e, até agora, não há um só hectare com proteção contratada. No atual ciclo, a oleaginosa deverá ocupar 49,1 milhões de hectares, estima a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
O Ministério da Agricultura admite que “não há previsão de desbloqueio do orçamento” em 2025 e que, assim, não haverá recursos para a subvenção dos prêmios de seguro da safra de verão, a principal do país. A soja, o principal produto agrícola do país, ficará sem apoio federal para contratação de apólices neste ano.
Temores ao Sul
O quadro preocupa especialmente os agricultores do Paraná e do Rio Grande do Sul. Os dois, que são os que mais contratam apólices com o subsídio, temem os efeitos do fenômeno La Niña, confirmado para o verão e que pode causar secas no Sul do país.
Até o momento, considerando todas as culturas agrícolas, e não apenas a soja, o PSR alcançou menos de 2,2 milhões de hectares. A previsão de integrantes da indústria é que a área total de outras culturas coberta com ajuda federal não chegue a 3 milhões de hectares. Caso a projeção se confirme, a cobertura será de menos da metade da área de 2024, que foi de 7,1 milhões de hectares.
A área coberta por seguro neste ano é a segunda menor da série histórica — a menor foi a de 2006, primeiro ano da série, quando 1,7 milhão de hectares tiveram cobertura de seguro com subvenção dos prêmios. O pico foi em 2021, com 13,6 milhões de hectares.
“Um corte de 30% no orçamento do programa está sendo dado na operação de soja”, diz Glaucio Toyama, presidente da Comissão de Seguro Rural da Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg). Em 2024, a cobertura de seguro com subvenção alcançou 4,7 milhões de hectares de soja. Em 2020 e 2021, a área passou de 8 milhões de hectares.
Toyama será um dos participantes da segunda edição do Agro Horizonte, que ocorrerá na quarta-feira, em Brasília, e que terá o seguro rural como um dos temas dos debates. O evento, uma iniciativa da “Globo Rural” e do Valor, reunirá especialistas para discussões sobre as transformações e desafios recentes e também as oportunidades que se apresentam para o setor. A “Globo Rural” e o Valor integram o núcleo formado ainda pelo jornal “O Globo” e pela Rádio CBN.
O milho segunda safra lidera as contratações subsidiadas em 2025, com 1,4 milhão de hectares. Na sequência aparecem café, trigo, pecuária, uva, maçã, tomate, cana-de-açúcar e florestal.
No Paraná, a cobertura de seguro com subvenção garantiu a proteção de 2 milhões de hectares, dos quais 1,3 milhão foram de soja. Neste ano, o Estado ainda é o que tem a maior área segurada, mas os 943,5 mil hectares são de milho segunda safra, trigo e cevada.
Jefrey Albers, gerente do Departamento Técnico e Econômico da Federação da Agricultura e Pecuária do Paraná, disse que o seguro sem subvenção é caro. Com isso, a contratação compromete as finanças dos produtores. “Sem subvenção, o produtor planta sem seguro. A consequência é que ele pode ficar sem dinheiro para pagar o financiamento. Isso vira uma bola de neve, que é o endividamento que estamos vendo”, afirmou.
À medida que área protegida diminui no país, a preocupação aumenta. Em 2025, de acordo com a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), o seguro rural deve cobrir pouco mais de 2% da área total de cultivo. Enquanto isso, os prejuízos com problemas climáticos só crescem. Segundo cálculos da Confederação Nacional de Municípios (CNM), no intervalo de uma década, os extremos climáticos causaram prejuízos de mais de R$ 300 bilhões à agropecuária brasileira.
“Neste ano, teremos o menor índice de cobertura de seguro rural na agricultura brasileira por causa da redução dos recursos alocados pelo governo (…) A área plantada será de mais de 90 milhões de hectares, e estamos indo para 3 milhões de hectares cobertos”, disse o presidente da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), Dyogo Oliveira, em evento recente em Brasília. Ele defende que o governo priorize a oferta de recursos para a subvenção ao prêmio.
Sem orçamento para subsidiar as apólices da safra de verão, as seguradoras começaram a cobrar dos produtores a parte referente à subvenção das coberturas já contratadas, de 20%. Isso significa mais custo para os agricultores que contrataram seguro na expectativa de acessar o PSR. Se o produtor não pagar o boleto, as seguradoras podem reduzir a vigência da apólice ou o limite máximo de indenização.
“O seguro rural existe para dar segurança a quem produz. Se os recursos não forem liberados, o custo será transferido ao produtor, que não tem condições de arcar com essa despesa”, afirmou Eugênio Zanetti, vice-presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag-RS).
Endividamento do campo
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) concorda que a falta de recursos para a subvenção do seguro rural vai piorar o endividamento no campo. “Sem condições adequadas no seguro rural, os pedidos de repactuação de dívidas tendem a se intensificar no próximo ano”, diz Guilherme Rios, assessor técnico da entidade.
Em junho, o Ministério da Agricultura fez uma contenção de R$ 445 milhões do orçamento do PSR. Em agosto, o governo liberou R$ 90,5 milhões desse montante, mas R$ 354,6 milhões seguem bloqueados. Além disso, o governo usou R$ 67 milhões do verba para o ano, de R$ 1,06 bilhão, para pagar apólices contratadas em 2024.
O Ministério da Agricultura informou que os R$ 90,5 milhões descontingenciados em agosto não vão mais reforçar o programa. “Apesar do descontingenciamento, esse valor precisou ser praticamente cancelado, em função das restrições orçamentárias”, explicou o ministério, em nota. A Pasta disse que “não há sobras” de verba e que todo o montante autorizado (R$ 547,7 milhões) “foi devidamente utilizado no período de janeiro a agosto”.
Pedro Loyola, coordenador do Observatório do Seguro Rural do Centro de Estudos do Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGV Agro), vê “desestruturação” do seguro rural. “Chegamos a ter 14 milhões de hectares cobertos, e agora estamos projetando no máximo 3 milhões de hectares, sem perspectiva de reposição do orçamento e sem prioridade para a política no Plano Safra”, disse.
Por globo
— Brasília










