A recente sentença da 2ª Vara de Família e Sucessões de Anápolis, que condenou um pai ao pagamento de R$ 15 mil a cada um dos dois filhos por abandono afetivo, trouxe novamente à tona a discussão sobre o dever jurídico de convivência familiar e as consequências emocionais do afastamento parental. O caso, julgado pelo juiz Bruno Leopoldo Borges Fonseca, reconheceu que a distância física e emocional não exime o genitor da obrigação de exercer o cuidado afetivo e educativo previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Para a advogada Laudiene Andrade, vice-presidente da Comissão de Sucessões da OAB-GO, a decisão é emblemática e já reflete a nova Lei nº 15.240/2025, sancionada há menos de uma semana, que inclui o abandono afetivo como ilícito civil.
“Essa sentença mostra que o tema deixou de ser apenas teórico. O Judiciário tem reconhecido o abandono afetivo como violação de um dever legal e aplicando a lógica da responsabilidade civil aos vínculos familiares. Quem negligencia o afeto, responde por isso”, explicou ao Jornal Opção
Segundo a advogada, o abandono afetivo ocorre quando um dos pais se omite de forma intencional e contínua, deixando de oferecer cuidado, presença e orientação. “A criança precisa do respaldo emocional e da figura protetiva dos pais. Quando há ausência de convivência, carinho e diálogo, há abandono afetivo. Isso causa prejuízos psíquicos profundos, muitas vezes irreversíveis”, afirma.
Ela acrescenta que, entre os principais critérios analisados pela Justiça, estão a ausência física prolongada, a falta de vínculo emocional, e a negligência com o dever educativo e afetivo.
“O amor não se obriga, mas a responsabilidade, sim”, disse.
Laudiene ressalta que o objetivo da indenização não é “comprar afeto”, mas reparar o dano emocional causado pelo abandono. Citando decisão da ministra Nancy Andrighi, do STJ, ela explica que o amor não pode ser imposto, mas a responsabilidade parental é dever jurídico.
“A indenização não obriga o amor, mas reconhece que houve uma lesão moral. A ausência não pode mais ser tratada como um simples fato da vida, e sim como uma omissão passível de sanção”, diz.
A advogada afirmou que a nova legislação altera o ECA para estabelecer o dever jurídico de cuidado emocional, educativo e afetivo dos pais. A norma surge em resposta a um cenário em que 70% a 80% dos lares brasileiros são chefiados por mulheres, segundo o IBGE.
“A maternidade é obrigatória, mas a paternidade tem sido tratada como facultativa. A nova lei corrige essa distorção e afirma que a ausência também gera responsabilidade”, observa.
Apesar do avanço, Laudiene alerta para possíveis efeitos adversos da aplicação da lei, caso o cumprimento da convivência se torne forçado.
“O risco é gerar situações de convivência apenas por obrigação, sem vínculo afetivo real. Isso pode expor crianças a novos tipos de violência, física, psicológica ou até sexual, se o contato ocorrer sem preparo ou acompanhamento adequado”, adverte.
Para a advogada, o foco deve ser o reconhecimento da dor da vítima e a educação afetiva dos pais, não a imposição artificial de convivência. “O abandono afetivo é uma ferida social que precisa ser discutida com empatia e responsabilidade. Reconhecer o dano é o primeiro passo para mudar a cultura da omissão parental”, completou.
Fonte: Jornal Opção










